
Artista: Carlos Latuff
Adão Paiani comenta a seguinte nota publicada hoje na “Página 10″ do jornal Zero Hora:
A nota: Catástrofe
Geólogo e funcionário de carreira da Fepam, o ex-secretário José Alberto Wenzel viaja hoje para New Orleans, nos Estados Unidos. Vai acompanhar o desastre ambiental no Golfo do México como observador do governo gaúcho. Wenzel explica o motivo da viagem:
– Embora o Rio Grande do Sul não tenha poços de petróleo, quero compreender o que está acontecendo no Delta do Mississippi e no sistema lagunar da região e ver que lições podemos tirar dessa catástrofe.
O comentário de Paiani
“Geólogo de carreira”, bem, isso explica muita coisa. Principalmente a sua capacidade, quando dentro do governo, de elaborar as defesas mais absurdas, fazendo até as pedras corarem. A técnica para isso deve ter sido aprendida no curso de formação.
Mas já que é com dinheiro do contribuinte, mais produtivo seria mandar o “Secretário da Transparência”, Francisco Luçardo, ver como são tratados nos EUA os crimes contra a administração pública. No entanto, não deixa de ser uma bela maneira de YRC compensar o seu ex-Chefe da Casa Civil pelos serviços prestados: com um agradável período de férias, pagos do nosso bolso.
Ainda cabe uma pergunta: será que vai para o “Portal da Transparência” do Governo do Estado?
Lá, se faz justiça. Aqui, se permite que o Exército deboche da democracia
O Ministério de Educação da província argentina La Pampa estuda tomar medidas severas contra a professora Susana Orn, do município de General Campos, que cometeu o seguinte erro cívico: no ato do Bicentenário da Independência, a 25 de maio, a professora do ensino fundamental incluiu por conta própria o ex-ditador general Leopoldo Galtieri e o ex-presidente Julio Roca, ambos como personagens destacados da pátria, e o segundo ainda como alguém que exterminou os índios de La Pampa, que para ela teve um sentido edificante. A diretora da escola - segundo matéria de capa do diário portenho Página 12, edição de hoje - Ana María Fransante, assegurou que o ministro de Educação, Néstor Torres, "quase desmaiou quando escutou a professora".
Vejam como são as coisas. Enquanto isso no Brasil, o portal web do glorioso Exército brasileiro faz encômios e loas ao golpe de abril de 1964, reinterpretando-o como "Revolução Democrática de 1964" (ver post de ontem, abaixo). E não acontece nada. E o ministro da Defesa, responsável pelas armas militares, Nelson Jobim, faz olho branco. No Congresso não se ouve uma referência sequer à provocação e à desfaçatez dos militares.
Na Argentina, uma professorinha protofascista manifesta sua admiração por dois genocidas, Galtieri (ditador entre 1981/82) e Roca (exterminador de 20 mil índios mapuches, no século 19), e é motivo de justa indignação na imprensa e entre as autoridades federais. No Brasil, o Exército debocha de forma provocativa do próprio governo democrático - a qual deve respeito e disciplina constitucional - e tudo permanece como se nada tivesse acontecido.
Observem como é importante uma ação de governo no sentido de abrir o debate sobre o passado ditatorial. Na Argentina, mesmo os governos liberais, como o de Alfonsin e De La Rua, passando pelo casal Kirchner, houve uma preocupação com o exame acurado dos graves fatos acontecidos durante a repressão militar. Essa decisão - correta e elogiável - ilumina o debate nacional. Hoje, na Argentina, dois ex-ditadores estão presos e são oficialmente considerados torturadores/genocidas, pelo Poder Judiciário, Reynaldo Bignone e Rafael Videla. O oligarca José Alfredo Martinez de Hoz , uma espécie de mescla de Otávio Gouveia de Bulhões/Delfim Netto/Golbery do Couto e Silva, está preso. Ele tem, hoje, 85 anos de idade, e é acusado de genocídio, corrupção passiva e ativa e de atos de traição à pátria por ter alienado bens públicos de forma irregular e temerária.